Agência Aids
24/03/2024
A tuberculose (TB) é a doença infecciosa mais frequente nas pessoas vivendo com HIV e tem grande impacto na qualidade de vida e na mortalidade dessa população. De acordo com o Ministério da Saúde, no Brasil, uma pessoa vivendo com HIV tem 19 vezes mais chances de contrair tuberculose do que uma pessoa que não tem HIV. A proporção da coinfecção TB-HIV é de 8,6%.
A tuberculose configura, de acordo com o próprio Ministério da Saúde, um sério problema de saúde pública, com profundas raízes sociais. A epidemia de HIV e a presença de bacilos resistentes tornam o cenário ainda mais complexo. A cada ano, cerca de 70 mil novos casos são notificados na população geral, além do registro de 4,5 mil mortes em decorrência da doença.
Por isso, o Ministério da Saúde recomenda que, em todas as oportunidades de atendimento às pessoas vivendo com HIV, seja feita a investigação para tuberculose. Da mesma forma, todas as pessoas diagnosticadas com tuberculose devem ser testadas para o HIV.
No Dia Mundial de Combate à Tuberculose, celebrado neste domingo, 24 de março, a Agência Aids conversou com a infectologista Cláudia Mello, do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, sobre a complexidade e gravidade da coinfecção TB-HIV. A especialista falou ainda sobre o risco aumentado que as pessoas vivendo com HIV/aids têm de desenvolver a tuberculose, uma vez que sua imunidade fica comprometida e pode evoluir para formas mais graves se não for diagnosticada e tratada de forma oportuna, eficaz e adequada.
De acordo com a médica, o fato de alguém viver com HIV, mesmo sem ter desenvolvido a aids, por si só já aumenta o risco de ter tuberculose. “Sabemos que a prevalência da Tuberculose na população que vive com HIV é muitas vezes maior que a prevalência na população geral. Por isso, indica-se que em toda consulta, o profissional médico esteja atento ao paciente HIV+ para rastrear sintomas de tuberculose. Esta deve ser sempre uma preocupação!”.
Dra. Cláudia Mello explica que a TB é considerada uma doença definidora de aids. Em outras palavras, a tuberculose é um sinal de que a pessoa está com o sistema imunológico muito enfraquecido devido à infecção pelo HIV. Dependendo do nível de imunossupressão (quantidade de células CD4, que são importantes para o sistema imunológico), a TB pode se manifestar de forma mais grave e disseminada, o que aumenta o risco de óbito. Isso ocorre porque o sistema imunológico está muito debilitado para combater a infecção adequadamente, seja nos pulmões ou em outras partes do corpo.
“Todo mundo que teve contato com a tuberculose, seja quem passou pelo tratamento ou quem o corpo controlou a doença sozinha, pode gerar reativação da doença”. Além disso, um quadro de TB-HIV, somado a outra comorbidade, especialmente em caso de imunossupressão, pode piorar ainda mais o prognóstico.
“Eu trabalho na enfermaria do Emílio Ribas, lá a gente pega os pacientes que estão graves, que têm algum critério de internação. Em geral, eles têm uma imunidade muito baixa. É claro que são situações extremas, são pessoas ou que demoraram para fazer o diagnóstico de HIV, ou pessoas que têm algum impedimento para tomar medicação, seja ele social, psicológico, dentre outros… Às vezes até quadros graves de dependência ou os quadros psiquiátricos, mas é muito comum e isso aumenta a gravidade, aumenta o risco de óbito.”
Tratamento
A boa notícia é que a tuberculose tem cura! O tratamento da doença, basicamente, se baseia na utilização de medicamentos específicos que combatem o bacilo Mycobacterium tuberculosis, bactéria responsável pelo desenvolvimento da TB.
Os antibióticos devem ser tomados por um período de, no mínimo, seis meses, eliminando os microrganismos causadores da doença. Vale ressaltar que a adesão correta ao tratamento é muito importante, pois a interrupção pode levar ao desenvolvimento de cepas resistentes da bactéria, dificultando o controle da doença.
No Brasil, o tratamento é gratuito através do SUS (Sistema Único de Saúde). São utilizados quatro medicamentos para o tratamento dos casos de tuberculose com o esquema básico: rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol.
Sinais e sintomas
Atenção, tosse por 3 ou mais semanas pode ser Tuberculose!
“Pensando no indivíduo, em caso de falha do médico em não exigir o exame de rastreio, o paciente deve estar sempre atento aos principais sintomas, que são eles: febre, tosse, perda de peso e sudorese noturna, que é o suor excessivo à noite.”
“O nosso Protocolo de Tratamento e Acompanhamento de Pessoas vivendo com HIV hoje pressupõe que a cada consulta o médico ativamente questione sobre esses sintomas. Além disso, a gente faz um rastreio também da tuberculose latente, porque a tuberculose pode estar no indivíduo como doença ou como tuberculose latente.”
A tuberculose latente é quando alguém tem a bactéria da tuberculose no corpo, mas não está doente.
“Esse tipo de TB a gente consegue rastrear através de exames ou PPD. Existe no SUS um exame mais novo e moderno, que se chama ‘IGRA’. A pessoa coleta o sangue e já pega o resultado. Não é algo que requer um profissional treinado para leitura ou que necessite que o paciente retorne duas ou mais vezes. Se o paciente já teve tuberculose, rastreamos somente os sintomas para ver reativação; mas se é a primeira vez que ela tem um resultado positivo de TB, a gente indica tratar a TB latente, que também é um tratamento que requer medicação, mas muito mais simples, mais curto e menos tóxico.”
Outros cuidados
Além de destacar a importância de estar atento aos sinais e sintomas, a infectologista Dra. Cláudia Mello aproveita para listar outros cuidados preventivos em saúde que podem ser adotados na rotina, pensando em se manter protegido da doença, em maior qualidade de vida e uma boa manutenção da imunidade. Confira:
Desigualdade social
Por último, a profissional destaca que combater à fome, à miséria e às desigualdades sociais são questões indispensáveis para acabar com a tuberculose enquanto problema de saúde pública e frear seu avanço, sobretudo entre os mais vulneráveis e desfavorecidos. “Se for para levantar alguma bandeira, com certeza, é a da redução das desigualdades. Tanto das desigualdades internas de cada país, que o Brasil é um dos que ranqueia muito [negativamente] nesse aspecto, mas também das desigualdades entre os países do mundo. É completamente injusto a gente ter países que concentram grande parte do PIB mundial, enquanto países ou até mesmo continentes inteiros, como é o caso da África, fiquem com tão pouco.”
“A redução das desigualdades, sem sombra de dúvidas é urgente e impactaria na prevalência dessas doenças, tanto do HIV, quanto da Tuberculose. Se uma pessoa tem o mínimo de dignidade, condição de vida e acesso a comida, com certeza vai diminuir o risco dela adoecer”, finaliza.
Por Kéren Morais (keren@agenciaaids.com.br)