MOPAIDS
18/07/2025
O Movimento Paulistano de Luta Contra a Aids (Mopaids) realizou, na última quarta-feira (16), sua reunião ordinária de julho, em formato virtual. O encontro contou com a presença de representantes de diversas organizações da sociedade civil que atuam na resposta ao HIV/aids, hepatites virais, tuberculose e outras condições associadas à vulnerabilidade social.
A abertura da reunião foi conduzida por Eduardo Barbosa, coordenador do Mopaids, que deu as boas-vindas e convidou brevemente os participantes a se apresentarem, conforme prática habitual. Em seguida, foram iniciados os debates a partir de uma pauta extensa e urgente, que incluiu o cenário internacional de financiamento, os impactos dos retrocessos nas políticas globais de HIV e saúde pública, os principais destaques da IAS 2025, além de informes e encaminhamentos importantes para o fortalecimento da articulação política do movimento.
O primeiro ponto de pauta abordou a crise no financiamento internacional da resposta ao HIV/aids, especialmente diante do esvaziamento progressivo de iniciativas históricas como o PEPFAR (Plano de Emergência do Presidente dos Estados Unidos para o Alívio da Aids). Os participantes alertaram para os riscos concretos de retrocessos até 2029 e para a forma como os desdobramentos internacionais — como os impactos políticos das decisões da OMS e os rumos da IAS — afetam diretamente o Brasil.
Como encaminhamento, foi proposta a articulação com o Fórum das ONG/Aids do Estado de São Paulo (Foaesp) e outras redes do movimento para a ampliação dos debates sobre financiamento, orçamento público e estratégias de sustentabilidade, incluindo a realização de transmissões ao vivo.
A possibilidade de uma carta ao vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, também foi discutida. A proposta é chamar atenção do governo federal para a urgência de discutir a quebra de patentes de medicamentos como medida de soberania sanitária e de reciprocidade frente às barreiras impostas por países como os Estados Unidos. Os ativistas ressaltaram que esse debate precisa estar alinhado a uma estratégia concreta de monitoramento da capacidade nacional de produção de insumos, enquanto Américo Nunes, presidente do Instituto Vida Nova, alertou para lacunas importantes, como a ausência de indicadores técnicos que sustentem uma política de produção nacional robusta — um dos pontos já mencionados em documentos recentes do Enong.
Ainda sobre a conjuntura internacional, foi destacada a importância de convidar o representante da Anaids que participou da 13ª Conferência Internacional de Ciência sobre HIV da IAS, realizada em Kigali, Ruanda, para uma live pública. A ideia é compartilhar com o coletivo os principais aspectos discutidos no evento, como os avanços em tecnologias injetáveis de prevenção, os desafios éticos das pesquisas clínicas, os entraves no acesso aos medicamentos e as mudanças nas estratégias de enfrentamento global ao HIV.
A proposta é que esse representante traga também insumos para que o Mopaids possa organizar seu posicionamento político e estratégico diante dos desafios colocados pelo cenário internacional.
Durante a reunião, também foi discutido o cenário nacional, com destaque para o protagonismo que o Brasil voltou a exercer em iniciativas de prevenção e assistência no campo do HIV/aids. No entanto, foi feito um alerta sobre a fragilidade do apoio às ações conduzidas pela sociedade civil.
Um dos exemplos apresentados foi a dificuldade enfrentada no processo de finalização do edital de 2024, conduzido pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) com recursos do Departamento de HIV, Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e ISTs (Dathi), do Ministério da Saúde. Apesar de 33 organizações sociais já terem cumprido todas as etapas, inclusive o envio da documentação e das certificações exigidas há mais de quatro meses, novas exigências estão sendo feitas pela OPAS, atrasando ainda mais a liberação dos recursos.
Entidades da sociedade civil, incluindo organizações da capital paulista, criticaram duramente a condução do processo por parte da OPAS Brasil, apontando uma postura burocrática e descolada da parceria histórica construída com o Dathi. A estimativa é que o processo ainda sofra um atraso adicional de dois meses, o que foi considerado inaceitável pelos participantes.
Em resposta, o movimento social encaminhou cartas de repúdio e pedidos formais de intervenção tanto à sede da OPAS em Washington quanto ao próprio Dathi. O impasse, segundo os ativistas, está travando a abertura de pelo menos oito novos editais previstos para 2025.
Durante a reunião, Adriana Galvão Ferrazini, presidente do Projeto Criança Aids (PCA) e integrante do Mopaids, compartilhou um informe detalhado sobre a Reunião Regional sobre Eliminação da Sífilis e da Sífilis Congênita como problema de saúde pública, promovida pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) entre os dias 1 e 3 de julho, em São Paulo.
O evento reuniu representantes de 22 países das Américas, além do Ministério da Saúde, Unicef, AHF e organizações da sociedade civil. De acordo com os dados apresentados — e relatados por Adriana — os casos de sífilis congênita aumentaram 40% entre 2016 e 2023, ultrapassando 35 mil registros apenas no último ano. Entre os 26 países que forneceram informações à OPAS, 19 relataram crescimento da infecção entre gestantes.
Adriana destacou que a reunião apontou caminhos para a ampliação da testagem, do diagnóstico precoce e do tratamento durante o pré-natal, além da importância de integrar os esforços entre governos, organismos internacionais e sociedade civil.
“A participação da sociedade civil é fundamental neste processo. São as ONGs que acessam os vulneráveis, promovem a testagem, colhem dados e fortalecem a rede pública. A troca de experiências nessa reunião foi imensurável e trará impactos positivos para os países participantes”, afirmou.
Ela também reforçou que a sífilis é uma IST curável, mas que pode causar danos neurológicos e até morte fetal se não tratada adequadamente — o que exige resposta contínua e estruturada.
O Mopaids manifestou seu compromisso em acompanhar os desdobramentos da reunião internacional e seguir contribuindo com ações locais e regionais que ajudem a conter o avanço da sífilis congênita como problema de saúde pública.
A reunião também trouxe atualizações sobre as frentes de incidência política em curso. Entre elas, a participação ativa no Grupo de Trabalho sobre HIV, Aids e Tuberculose da Comissão de Saúde da Câmara Municipal de São Paulo; o diálogo com o Conselho Nacional de Saúde por meio da Anaids; e a mobilização para uma audiência pública na Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP), que discutirá dois projetos de lei voltados à população afetada pela tuberculose: um sobre isenção tarifária no transporte público e outro sobre segurança alimentar.
Nos informes, Américo Nunes anunciou a realização de um seminário sobre sífilis em agosto, com inscrições já abertas. Também foi destacada a contribuição do Mopaids na organização do Seminário de Hepatites Virais promovido pelo Movimento Brasileiro de Luta Contra as Hepatites Virais (MBHV), que acontecerá entre os dias 12 e 14 de agosto, na sede da AHF, em São Paulo.
Alisson Barreto, do GIV, relembrou a recente atuação do GT de HIV, Aids e TB na Câmara dos Vereadores e reforçou a importância da participação contínua das organizações nos espaços institucionais de decisão.
Fechando a pauta, foi discutida a necessidade de atualizar o cadastro das organizações integrantes do Mopaids e de normatizar os mecanismos de comunicação interna. Um formulário enviado previamente pelo colaborador Marcel será utilizado para sistematizar os dados, melhorar a fluidez da comunicação e garantir maior objetividade nas deliberações coletivas.
O Mopaids reafirma, com essa reunião, seu papel histórico na luta contra a aids e na articulação de políticas públicas com base nos direitos humanos, na ciência e na justiça social, diante de um cenário marcado por desafios, mas também por resistência e compromisso coletivo.
Redação Mopaids